A renda e a posição socioeconômica têm grande influência sobre a capacidade de leitura e aprendizado dos jovens – e essa desigualdade é mais acentuada no Brasil do que em grande parte do mundo, aponta a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em seu relatório Education at Glance, divulgado nesta quinta-feira (16/9).
Por sua vez, a capacidade de leitura e interpretação de textos afeta a habilidade dos jovens em se desenvolverem social e profissionalmente e exercerem sua cidadania.
A OCDE usa como base comparativa os resultados de leitura do Pisa 2018, o exame internacional aplicado pela entidade em jovens de 15 anos nos 38 países-membros do grupo e em Argentina, Brasil, China, Índia, Indonésia, Rússia, Arábia Saudita e África do Sul.
A habilidade de leitura é definida pela OCDE como a “capacidade de entender, usar e refletir sobre textos escritos de modo a conquistar objetivos, desenvolver conhecimento e potencial e participar da sociedade”.
Em uma escala de 1 a 6, o nível de leitura considerado básico é o 2 – estágio em que os estudantes “começam a demonstrar competências que vão lhes permitir participar de modo efetivo e produtivo na vida como estudantes, trabalhadores e cidadãos”.
No Pisa 2018, os alunos brasileiros pontuaram, em média, 413 em leitura (para efeitos comparativos, a China, que encabeça o ranking, pontuou 555 nesse quesito), mantendo-se praticamente estagnado na última década.
E essa média esconde disparidades sociais, que foram exploradas no relatório apresentado nesta quinta.
No Brasil, diz a OCDE, a proporção de jovens da camada mais pobre que conseguiu alcançar o nível 2 em leitura do Pisa foi 55% menor do que a de jovens brasileiros de renda mais alta.
Essa disparidade é 26 pontos percentuais superior à média dos países da OCDE, de 29%, onde também se observa desigualdade em leitura entre alunos ricos e pobres.
“Entre os fatores que influenciam o desempenho na educação, o status socioeconômico tem o maior impacto nas habilidades de literacia dos jovens de 15 anos, mais do que seu gênero ou país de origem”, diz o relatório Education at Glance.
No Brasil, porém, observou-se “uma das maiores disparidades de performance entre os países que têm dados disponíveis”, prossegue o texto.
O tema havia sido abordado pela OCDE em maio deste ano, quando a entidade divulgou que, no Brasil, apenas um terço (33%) dos estudantes havia sido capaz de distinguir fatos de opiniões em uma das perguntas aplicadas no Pisa.
Na ocasião, o diretor de educação da OCDE, Andreas Schleicher, também se disse preocupado com o aumento no “abismo cultural” entre estudantes de classes sociais mais avantajadas e os mais pobres em todo o mundo.
Enquanto entre os estudantes mais ricos o número de livros em casa se manteve estável entre 2000 e 2018, esse número caiu consideravelmente entre os estudantes mais pobres globalmente.
O status socioeconômico segue tendo impacto na vida dos jovens ao diminuir seu acesso ao ensino superior e, desse modo, deixá-los mais vulneráveis ao desemprego, prossegue o relatório.
O relatório lançado pela OCDE nesta quinta aborda diferentes aspectos da desigualdade na educação global, desde questões de gênero até os impactos da pandemia no ensino.
No caso do Brasil, um dos pontos destacados é o fato de as mulheres terem, em média, mais tempo de educação que os homens, mas enfrentarem barreiras adicionais no mercado de trabalho.
Embora mais mulheres brasileiras de 25 a 34 anos tenham diplomas do ensino superior do que homens (27% contra 20%, segundo dados de 2018), elas têm mais probabilidade de estarem desempregadas do que eles.
A OCDE cita que, enquanto 85% dos homens com ensino superior estavam empregados no Brasil em 2018, entre as mulheres com a mesma qualificação essa taxa era de 77%.
Essa disparidade foi acentuada na pandemia, conforme um estudo recente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que apontou que mulheres estavam, junto a negros e jovens, entre os grupos mais vulneráveis ao desemprego no país.
No que diz respeito a gastos na educação, segundo os dados de 2018, o Brasil gastou porcentagem do PIB (5% na época) semelhante à média da OCDE.
No entanto, quando se observa o gasto por aluno (da educação básica até o ensino superior), ele é de apenas um terço da média gasta pelos países da OCDE: US$ 3,2 mil por estudante anualmente, contra US$ 10 mil por estudante na média da OCDE.
Os dados mais recentes apontam uma redução nos investimentos na educação básica pública do país: segundo o Anuário do setor, produzido pela entidade Todos Pela Educação, Estados e municípios brasileiros gastaram R$ 21 bilhões a menos em 2020 em relação ao ano anterior – e essa redução de gastos ocorreu justamente durante a pandemia, quando o setor enfrentou desafios sem precedentes.
Nesta quarta-feira (16/9), o Senado aprovou em primeiro turno uma PEC (proposta de emenda constitucional) que isenta de responsabilidade gestores públicos que não tenham investido o percentual mínimo de 25% de receitas com educação em 2020, por conta da pandemia. O texto da ainda precisa ser votado em segundo turno e seguir à Câmara dos Deputados.
Defensores alegam que o ajuste é necessário por conta da queda de arrecadação e desequilíbrio fiscal na pandemia; críticos, porém, afirmam que a proposta abre perigosos precedentes, traz retrocessos a um setor já duramente abalado pelo tempo de aula perdido durante o fechamento das escolas e “premia” gestores que não se dedicaram à educação em um momento crítico como o da implementação do ensino remoto.
FONTE: G1 Educação